Dá, sim, para pensar em uma renúncia de Jair Bolsonaro


 
Jair Bolsonaro em foto oficial clicada por Alan Santos

Não é feio para ninguém. A renúncia faz parte do processo democrático e, em vários casos na história, tem sido benéfica. Em alguns casos pode ter sido ruim. Mas, no geral, renúncias acabam por serem boas para a estabilidade política, social e, até, econômica de países democráticos. Importante destacar aqui o “democráticos”. A renúncia faz parte das grandes democracias ao redor do mundo, como na Inglaterra, Áustria, Estados Unidos e até mesmo aqui, no Brasilzão.


A rotina mais recente de renúncia no Brasil acabou camuflada pelo processo de impeachment de 1992, quando Fernando Collor de Mello foi impedido pelo Congresso Nacional de seguir o mandato. Ao mesmo tempo, no entanto, Collor havia renunciado, em uma tentativa de evitar a perda de seus direitos políticos e também não passar como alguém que não tenha dado o braço a torcer. Não deu certo. Perdeu o mandato, os direitos políticos por oito anos e ainda hoje muita gente não faz ideia de que ele tenha renunciado. Para a maioria esmagadora da população brasileira, Collor sofreu impeachment e pronto. Não adianta lembrar da renúncia.

Renúncias são relativamente boas para a manutenção da estabilidade dos países. Tanto em sistemas presidencialistas quanto em governos parlamentares, onde existe a figura da montagem do gabinete de governo. Sentiu que não está agradando? Pede para sair. Aí vêm as forças vivas em montam um novo gabinete. Nos sistemas presidencialistas, o vice assume. Está ali para isso mesmo.

Jair Bolsonaro está no limite de perda total de credibilidade política. Poucos ainda gostam dele. Claro, claro. Há aqueles que não gostariam dele de maneira nenhuma, pois votaram no outro candidato que perdeu no segundo turno em 2018. É do jogo. Mas, Bolsonaro vem esgotando seu repertório de estilo "cara simples que come pastel na padaria, de pé, no balcão". Isso agrada a um pedaço do seu público. Mas não é suficiente para passar credibilidade e dar um norte no mar agitado em que se tornou a política em tempos de pandemia. 

Não está fácil para ninguém. A proliferação de casos da Covid-19 tem abalado estruturas de governo em todo o mundo. Espanha, França, Inglaterra, Japão, Bélgica, entre outros países bacanas têm registrado multidões questionando seus respectivos governos. O vírus deixa de ser um problema apenas sanitário para ser uma hecatombe política e econômica. 

Voltando ao Brasil, Bolsonaro tem mostrado que não é um administrador, líder, gerente ou comandante de pelotão. Na grande maioria de suas ações, dá ordens atravancadas, desautoriza subordinados e desrespeita alguns ritos já consagrados na recente democracia brasileira. Não deveria ter mandato jornalista calar a boca, mesmo sabendo-se que a imprensa tem uma particular antipatia pelo Presidente da República. Sempre há que se ter o sangue de barata para levar a contenda numa boa. Especialmente sendo o Presidente. Não deveria também ter levado, de maneira improvisada, um grupo de empresários até o Supremo Tribunal Federal, sem agenda, sem aviso, sem nada. E, por último, não deveria lidar com tanta improvisação e diletantismo em relação a qual medicamento deve ser usado no tratamento dos doentes da Covid-19. Não dá para brigar com a medicina. Muito menos com médicos. 

Bolsonaro vai além nas brigas. Está brigando com quase todos os governadores brasileiros. Realmente, não é possível lembrar um governador que esteja fechadão 100% com o Capitão. 

O Presidente da República dá ares de importância nacional a questões prá lá de paroquiais. A causa da mudança do comando da Polícia Federal no Rio de Janeiro... é caso de interesse próprio, por mais malabarismo retórico que Bolsonaro faça. Assim como medidas provisórias como a regularização fundiária e de isenção dos funcionários públicos que tenham agido de má-forma durante a pandemia. Parecem coisas nacionais, mas, no fundo, beneficiariam o Presidente. 

A questão do Rio de Janeiro, por exemplo. A briga em que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e Bolsonaro travam pode ter, no fundo, uma questão paroquial: a política do Rio de Janeiro. Rodrigo é filho de Cesar Maia, vereador no Rio, colega do filho doe Bolsonaro, Carlos. Há uma disputa para quem vai receber o apoio do Presidente da República para as eleições municipais. É uma hipótese: o Brasil está assistindo a uma luta paroquiana entre o filho do Presidente da República (Carlos) e o pai do presidente da Câmara Federal (Cesar). 

No fundo, no fundo, o barraco todo é uma disputa entre dois vereadores.

Vice-presidente Hamilton Mourão (Foto: Ueslei Marcelino/Reuters)


Em relação à questão da renúncia. Jair Bolsonaro está com dificuldades para governar. O Supremo Tribunal Federal está em cima, os governadores não o respeitam e a grande mídia também já rompeu com o Capitão há horas. Mesmo com grupos organizados de Bolsonaristas Brasil a fora, o Presidente é um pato manco. Manda pouco, não pode fazer tudo o que se comprometeu na campanha. Tem que negociar com o Congresso. E é no Congresso que ele encontra uma grande resistência. E precisa negociar.

Com a renúncia, o projeto votado pela maioria dos eleitores em 2018 continuaria. A busca por um país mais liberal na economia e mais conservador nos costumes, uma certa melhoria nas condições do ambiente de negócios e uma leve saída do estado brasileiro do setor empresarial, com venda de estatais para o capital privado. Mais inserção econômica do Brasil no mundo e por aí vai. Mesmo com a renúncia, o Brasil seguiria o projeto, desta vez, pelas mãos do vice-presidente, o general Hamilton Mourão. 

Bolsonaro traz instabilidade política e econômica a cada entrevista quebra-queixo que dá na entrada do Palácio da Alvorada. Fala todo dia, sem pauta, sem preparação, sem nada. Ele é o Presidente da República, tem que falar bonito e de maneira pensada. Caso contrário, tem grande chances de virar problema. E os problemas acontecem após nove em cada dez falas do Capitão. 

A renúncia traria estabilidade e paz nas bolsas, nos mercados em geral e uma esperança de que, quando a pandemia passar, vai haver emprego e oportunidades de negócios e renda. Antes da pandemia do Corona, Bolsonaro até ensaiava uma surfada na retomada da economia. Mas, quando o bicho pegou, perdeu a prancha. Até mesmo seu Posto Ipiranga, o Ministro Paulo Guedes, às vezes acha que sua batata está assando, na maneira como Bolsonaro o deixa de lado em algumas questões. Mesmo dizendo que na economia, quem manda é Paulo Guedes. 

O pessoal sabe que não é bem assim. 






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