Crise da Languiru: um memento mori para lembrar que cooperativas também podem acabar




Por muito tempo, o marketing de cooperativas que oferecem produtos e serviços de todos os tipo vinha com o subtexto: cooperativas não quebram. Do ponto de vista estritamente jurídico, realmente, elas não quebram porque não vão à falência. Mas elas podem deixar de existir, como resultado de uma administração ruim. 

O caso da cooperativa Languiru está servindo como um memento mori, o ditado da Roma Antiga que era usado para lembrar que mesmo os generais mais fortes e poderosos um dia morreriam. Sim. Há nuances jurídicas separando as cooperativas de crédito e aquelas que oferecem serviços e planos de saúde aos consumidores. No entanto, para o imaginário das pessoas comuns, cooperativas são cooperativas e ponto final. 

E as cooperativas, de modo geral, usam essa generalização na hora de vender seus produtos, serviços e até mesmo para agregar novos cooperados. "Cooperativas não quebram e têm uma governança acima da média", é o senso comum. Pois, há alguns problemas.

Cooperativas são, sim, modelos de negócio que abrangem o associativismo, a solidariedade e a busca de um bem comum. A proximidade com as comunidades onde estão inseridas, o ambiente de pertencimento e a facilidade de acesso aos gestores sempre foram pontos de atratividade para as cooperativas.

Nos últimos anos, com a expansão das cooperativas de crédito, ou bancos cooperativos, a ideia de que "cooperativa não quebra" voltou a mil nos anúncios e no coletivo de quem acompanha o empreendedorismo.

Tudo ia muito bem até surgir o problema da crise da cooperativa gaúcha Languiru. É um tradicional empreendimento que produz laticínios, carne de suíno e frango processada além de atuar no varejo, na fabricação de rações e operação de postos de combustíveis. 

A Languiru não quebrou, por enquanto. Mas, tem uma dívida bilionária, atrasos em pagamentos de diversos fornecedores e uma gestão com problemas de relacionamento em níveis críticos. Para piorar a situação e a percepção de que a Languiru está em meio à pior crise de sua história de quase 70 anos, a direção da cooperativa quer vender patrimônio para um grupo chinês, além de linhas de produtos para a francesa Lactalis. 

A venda de patrimônio e linhas de produtos pode dar um fôlego financeiro à cooperativa, mas não tira o peso de anos de gestão complicada e questionável que trouxeram o empreendimento à atual situação.

O Vale do Taquari já tem uma história de quebra de cooperativas. No início da década de 1980, a Coopave quebrou e fez evaporar o patrimônio de centenas de famílias avicutoras. Muitas das famílias da extinta Coopave hoje são cooperadas da Languiru. O medo de um deja vú é grande para muita gente na região.

Cooperativas estão sujeitas aos humores do mercado, da má administração, de decisões erradas dos cooperativados e do personalismo dos diretores. Sempre é bom lembrar disso, mesmo com todo o marketing chamando cada vez mais cooperados e clientes. 

De vez em quando, surgem histórias para lembrar que a coisa não é bem assim. (Miguelito Medeiros, consultor de Marketing, Comunicação & Política)



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